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Da vassoura à metralhadora


Por Florestan Fernandes Júnior, para o Jornalistas pela Democracia*


O The New York Times, em artigo publicado em 7 de março, diz que Bolsonaro pode ter o mesmo fim que o ex-presidente Jânio Quadros, que durou apenas 7 meses no poder. Segundo o principal jornal dos Estados Unidos, Jânio também criticou os excessos do Carnaval brasileiro, assim como Bolsonaro. Em 1961, Jânio proibiu o biquíni e o lança-perfume. Agora, Bolsonaro foi bem além: para criticar o Carnaval, postou no Twitter imagens obscenas de dois foliões do Blocu. Para o Times, os motivos de Bolsonaro são claros: demonizar a comunidade L.G.B.T, tão atacada e marginalizada nos últimos anos pela direita ultraconservadora. Outra diferença entre Jânio e Bolsonaro é a repercussão dos posts do atual presidente, que foi manchete em toda mídia mundial. O inglês Financial Times chegou a falar em xixigate por conta da pergunta presidencial sobre o significado da expressão "golden shower".


Acho que comparar Jânio com Bolsonaro é uma ofensa à memória do ex-presidente. Jânio, antes de chegar à presidência, foi prefeito da capital paulista e governador de estado, sempre com boa avaliação de desempenho frente ao Executivo. Isso sem falar que ele foi professor de português no tradicional colégio Dante Alighieri. Gostava de ler e admirava as artes plásticas. Apesar dos dois terem sido eleitos com os votos da extrema direita, Jânio condecorou Che Guevara, tentou uma autonomia dos EUA e se aproximou da China. O ministério de Jânio estava anos-luz à frente do de Bolsonaro. Nas Relações Exteriores Jânio tinha Afonso Arinos de Melo Franco e, na Justiça, Oscar Pedroso Horta. Não dá para comparar, né?


Mesmo o moralismo de Jânio era fake. Em 1985 fiz uma entrevista com ele na campanha para prefeito de São Paulo. Perguntei os motivos para ter proibido o biquíni. Resposta: "proibi o biquíni por que aquilo era uma indecência. Aliás, respondendo a milhares de mulheres que me escreveram sobre a vestimenta." Terminada a entrevista fiz os contra planos: o cinegrafista se posiciona atrás do entrevistado e eu repito as perguntas para ajudar na edição.


Despreocupado, sabendo que eram apenas cenas de corte, Jânio responde novamente à mesma pergunta: "eu não tenho nada contra o biquíni, nem contra as mulheres desnudas. Aliás quanto mais, melhor. Agora, as feias que me perdoem, deveriam estar dentro de uma armadura medieval." Para minha alegria o cinegrafista fez os contra planos com lente aberta, aparecendo repórter e entrevistado. Chego na redação imaginando a repercussão de tal resposta. Minha felicidade durou pouco. Ao chegar na TV Globo já havia uma determinação da direção para não colocar no ar a resposta feita no contra plano.


Jânio foi o primeiro presidente a governar de Brasília. Ficava longe dos seus ministros, que ainda ocupavam seus cargos na antiga capital do Rio de Janeiro. Tinha o tempo todo livre para olhar aquela imensidão de terra vermelha dando asas às suas maluquices. Bolsonaro, não. Tem um celular nas mãos e um grupo de filhos antenados, ainda que malucos como o pai.


Mas, de fato, a comparação se justifica em um ponto: Bolsonaro pode acabar sem mandato, como Jânio. Até quando a população ou os próprios ministros do presidente vão aturar um Jânio piorado no poder, onde todos os esforços diários são para apagar incêndios e não para cuidar dos interesses do país?


Façam suas apostas.


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