top of page

Sobre a saída dos médicos cubanos do Brasil


Coluna Crítica & Autocrítica - nº 144


Por Júlio Garcia**


*Ainda sobre as eleições passadas – e seus reflexos (da série ‘desgraça pouca é bobagem’): Confirmando o verdadeiro ‘salto no escuro’ que o país deu ao eleger o candidato da extrema-direita para a Presidência da República - além de eleger uma bancada igualmente extremada e conservadora, em sua maioria, para o Congresso Nacional - (com a ajuda bilionária e decisiva dos disparos de milhares de mentiras contra Lula e o PT via whatsapp, caixa 2 etc...), as declarações provocativas, preconceituosas e depreciativas de Bolsonaro em relação aos valorosos médicos cubanos não poderia ter outro resultado senão na saída destes do Brasil. Perde a maioria do povo, especialmente os pobres e os trabalhadores. Um verdadeiro crime contra a saúde pública, o primeiro ato concreto do futuro governo Bolsonaro. Cuba não tinha outra alternativa: romper o acordo com o (des)governo brasileiro foi uma questão de dignidade; aliás, não poderia ser outra a reação de um governo que “não fala alto com a Bolívia” ... muito menos “abaixa a cabeça para os Estados Unidos” ... e muito menos ainda para um ‘bolnossauro tupiniquim'...


*Sobre esse tema, a mídia hegemônica e monopolista brasileira, como de hábito (juntamente com seus fiéis satélites regionais/municipais), omitiu a declaração do Governo Cubano sobre os motivos de sua saída do Programa mais Médicos. É importante que se saiba, sem distorções, as verdadeiras razões da saída dos médicos cubanos do Brasil. Nesse sentido, reproduzo abaixo a Nota [resumo] em que Cuba comunica sua dolorosa decisão:


“O Ministério da Saúde Pública da República de Cuba, comprometido com os princípios solidários e humanistas que durante 55 anos têm guiado a cooperação médica cubana, participa desde seus começos, em agosto de 2013, no Programa Mais Médicos para o Brasil.


A iniciativa de Dilma Rousseff, nessa altura presidenta da República Federativa do Brasil, tinha o nobre propósito de garantir a atenção médica à maior quantidade da população brasileira, em correspondência com o princípio de cobertura sanitária universal promovido pela Organização Mundial da Saúde.


Este programa previu a presença de médicos brasileiros e estrangeiros para trabalhar em zonas pobres e longínquas desse país. A participação cubana nele é levada a cabo por intermédio da Organização Pan-americana da Saúde e se tem caracterizado por ocupar vagas não cobertas por médicos brasileiros nem de outras nacionalidades.


Nestes cinco anos de trabalho, perto de 20 mil colaboradores cubanos ofereceram atenção médica a 113 milhões 359 mil pacientes, em mais de 3 mil 600 municípios, conseguindo atender eles num universo de até 60 milhões de brasileiros na altura em que constituíam 88% de todos os médicos participantes no programa.


Mais de 700 municípios tiveram um médico pela primeira vez na história. O trabalho dos médicos cubanos em lugares de pobreza extrema, em favelas do Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador de Baía, nos 34 Distritos Especiais Indígenas, sobretudo na Amazônia, foi amplamente reconhecida pelos governos federal, estaduais e municipais desse país e por sua população, que lhe outorgou 95% de aceitação, segundo o estudo encarregado pelo Ministério da Saúde do Brasil à Universidade Federal de Minas Gerais. (...)


O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, fazendo referências diretas, depreciativas e ameaçadoras à presença de nossos médicos, declarou e reiterou que modificará termos e condições do Programa Mais Médicos, com desrespeito à Organização Pan-americana da Saúde e ao conveniado por ela com Cuba, ao pôr em dúvida a preparação de nossos médicos e condicionar sua permanência no programa a revalidação do título e como única via a contratação individual. As mudanças anunciadas impõem condições inaceitáveis que não cumprem com as garantias acordadas desde o início do Programa, as quais foram ratificadas no ano 2016 com a renegociação do Termo de Cooperação entre a Organização Pan-americana da Saúde e o Ministério da Saúde da República de Cuba.


Estas condições inadmissíveis fazem com que seja impossível manter a presença de profissionais cubanos no Programa.


Por conseguinte, perante esta lamentável realidade, o Ministério da Saúde Pública de Cuba decidiu interromper sua participação no Programa Mais Médicos e foi assim que informou a Diretora da Organização Pan-americana da Saúde e os líderes políticos brasileiros que fundaram e defenderam esta iniciativa. Não aceitamos que se ponham em dúvida a dignidade, o profissionalismo, e o altruísmo dos colaboradores cubanos que, com o apoio de seus familiares, prestam serviço atualmente em 67 países.


Em 55 anos já foram cumpridas 600 mil missões internacionalistas em 164 nações, nas quais participaram mais de 400 mil trabalhadores da saúde, que em não poucos casos cumpriram esta honrosa missão mais de uma vez. (...) Na grande maioria das missões cumpridas, as despesas foram assumidas pelo governo cubano.


Igualmente, em Cuba formaram-se de maneira gratuita 35 mil 613 profissionais da saúde de 138 países, como expressão de nossa vocação solidária e internacionalista. Em todo momento aos colaborados foi-lhes conservado seu postos de trabalho e o 100 por cento de seu ordenado em Cuba, com todas as garantias de trabalho e sociais, mesmo como os restantes trabalhadores do Sistema Nacional da Saúde. (...)


Os povos da Nossa América e os restantes do mundo bem sabem que sempre poderão contar com a vocação humanista e solidária de nossos profissionais.


O povo brasileiro, que fez com que o Programa Mais Médicos fosse uma conquista social, que desde o primeiro momento confiou nos médicos cubanos, aprecia suas virtudes e agradece o respeito, a sensibilidade e o profissionalismo com que foram atendidos, poderá compreender sobre quem cai a responsabilidade de que nossos médicos não possam continuar oferecendo sua ajuda solidária nesse país.”

...


**Júlio César Schmitt Garcia é Advogado, Pós-Graduado em Direito do Estado, Assessor Parlamentar, Midioativista. Foi um dos fundadores do PT e da CUT. - Publicado originalmente no Jornal A Folha (do qual é Colunista) em 23/11/2018.

Destaque
Tags
bottom of page