Copa da Rússia: Após 7 x 1 e impeachment, dá para torcer pela seleção na Rússia?
Depoimento de quem torceu para o Brasil de 1970, em plena ditadura, mas que resiste em se juntar à tigrada do verde-amarelo em 2018
Foto: Manifestoches. Cúmplices da quadrilha do golpe e dos corruptos do futebol, eles se preparavam para afagar um cafajeste. Em 70, havia a ditadura - e também Pelé
A Copa de 1970, para o brasileiro oprimido por uma ditadura que prendia, torturava e matava nos calabouços da covardia militar, trazia um sofrido dilema político e ético. Torcer ou não torcer para a Seleção? Até que ponto uma vitória dos Canarinhos iria levar água ao moinho (expressão repetidamente ouvida à época) do regime de farda?
Como evitar que aquele presidente sanguinário, que se fazia de bonzinho nas tribunas dos estádios, com o radinho de pilha ao ouvido, tirasse vantagem de uma eventual conquista obtida em campo pelos talentosos operários da bola?
Nos círculos dos que estavam exilados em Paris, onde o aqui subscrito morava, as discussões foram particularmente acirradas. A capital francesa agrupava um considerável contingente de jovens do MR-8 e de tiozinhos do antiquado Partidão. Eram raros os trotskistas, salvo os mais abonados, e mais raros ainda os neomaoístas do PCdoB.
Como era praxe na esquerda, o debate sobre o tema Seleção invariavelmente descambava para um incendiário acerto de contas ideológico, cada facção acusando a outra de fraquejar no combate em prol do verdadeiro socialismo.
No dia (em Paris, na noite) em que o selecionado que fora arquitetado pelo comunista João Saldanha e agora se encontrava sob a vigilância de um staff militar ia estrear no México contra a Tchecoslováquia, ainda não havia sinal algum de consenso entre os expatriados brasileiros.
A tevê francesa foi documentar o dilema existencial na Casa do Brasil da Cidade Universitária, administrada pela embaixada, mas onde, paradoxalmente, encontravam abrigo muitos dos militantes e simpatizantes da esquerda. Estudantes costumavam ser de esquerda, em 1970. Assim como os jornalistas.
A Tchecoslováquia abriu a contagem aos 11 minutos de partida e um discreto alvoroço percorreu parcela da plateia, a qual de imediato se desiludiu ao ver Petras, o loiríssimo goleador tcheco que ali representava uma nação adepta do materialismo dialético, jogar-se de joelhos no gramado e fazer um convicto sinal da cruz.
Que diabo de país comunista era a Tchecoslováquia para exibir ao mundo tal exemplo de carolice? Como se sabe, a Seleção venceu por 4 a 1 e a galera da Casa do Brasil, num entusiasmo quase unânime, rompeu a madrugada festejando, com bandeiras vindas sabe-se lá de onde. (...)
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